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O DESPERTAR - Como e quando tudo começou

O DESPERTAR
Como e quando tudo começou


Eu relutei muito em abrir publicamente esses textos abaixo por serem muito, mas muito íntimos. Tanto que me senti no direito de ser egoísta e guardar para mim, mesmo depois de tomar consciência de quão importantes e significativos o são.

Ainda que decidida a publicar, quero mantê-los em uma página à parte, um lugar de destaque pelo significado que têm para mim. E só o faço porque percebi que podem ser úteis para o despertar de outras pessoas. Estamos vivendo um momento crucial de nossas existências no Planeta e não temos o direito de ser egoístas e reter algo somente para nós.

Quando MIKE veio ao Brasil pela segunda vez - 1993 - com a Dangerous, eu estava me recuperando de uma cirurgia e não pude ir vê-lo (ainda tinha 22 pontos na barriga). Mas essa data foi um divisor de águas para mim. Algo de muito sério aconteceu em minha vida, uma desilusão tamanha que me tirou o chão. Já havia passado por tantas perdas... Senti-me triturada de dor e fui invadida por uma absurda insatisfação generalizada, com tudo mesmo. Experimentei a SOLIDÃO: o estar sozinho sem que ninguém possa aliviar sua dor. Por outro lado, isso me fez submergir do mundo ilusório e comecei a buscar o lado espiritual da vida.

Mergulhei em um retiro espiritual, abandonando o emprego e ficando reclusa em casa por dez meses. Escrevi um livro - "O ÍDOLO DE BARRO" -, cujo personagem principal descrevia a personalidade, a essência e a vida pessoal de Michael - detalhes íntimos que eu não conhecia na época, quando ainda somente o via como um grande ídolo. Detalhes estes que só vieram ao conhecimento público após sua "morte". Eu descrevi o homem antes de o conhecer. Estranhamente, esse é o único livro que eu nunca quis publicar, como um tesouro que precisasse reter comigo. E continua sendo assim.

Hoje, estudiosa da Escola Egípcia, da Culturas Maia e Céltica, da Escola Gnóstica, tenho um melhor entendimento do que aconteceu, motivo pelo qual resolvi tornar público. Foi uma iniciação ao Conhecimento Espiritual. 

Desde o alinhamento dos planetas, em 1992, dando início aos últimos 20 anos de grandes mudanças na humanidade, eu fui um crescendo de descobertas e experiências - muitas delas doloridas - que me fizeram evoluir... evoluir... evoluir... Mas eu não tinha ideia dessa realidade.

Ainda na década de 80, Michael lançou a sua enigmática ANOTHER PART OF ME, mas somente vim a entender o que dizia nos últimos anos: Estamos enviando um amor maior / E esta é nossa mensagem para você / Os planetas estão se alinhando / Estamos trazendo dias melhores / Eles estão todos alinhados / Esperando por você / Você não consegue ver...? / Você é apenas outra parte de mim... Ou seja, ele detém esse Conhecimento há décadas; aliás, já nasceu desperto.



Daí em diante, a sua trajetória humanista cresceu consideravelmente até culminar no dia 25 de junho de 2009. São muito poucas as pessoas que conseguiram entender o que ele fez, e porque fez. Muitos fãs me perguntam como eu tenho tanta certeza e eu só posso dizer que SEI. Como é que vou explicar o imponderável? Como vou colocar em palavras o que só se pode sentir? Mesmo porque, para cada um o Conhecimento chega de forma diferente, cada um tem seu tempo próprio de despertar. Não é uma coisa que se possa transmitir.

Por tal motivo, ou seja, pensando nesses fãs é que decidi publicar esta página com os textos que descrevem o meu despertar. Textos escritos em 1993, quando eu nada conhecia da Escola de Sabedoria Egípcia, ou da Cultura Maia, ou da Cultura Céltica, ou do Conhecimento Gnóstico, ou da simbologia do UM...  


Eu os intitulei "A BATALHA DOS PIRILAMPOS" e subdividi em duas partes:
- "Espelho de Pedra": é a fase de desconstrução das ilusões. Esse não é um processo único, pontual ou repentino; leva muitos anos e atinge todas as áreas da nossa vida em vários acontecimentos, quais sejam, vida profissional,  vida afetiva, vida familiar, vida social... até que não reste qualquer tipo de fantasia, ilusão ou expectativa a respeito de qualquer coisa ou alguém.
- "Estilhaços de Cristal": fase em que todos os arquétipos ilusórios estão desconstituídos e o Ser volta à sua origem, ou seja, à Unidade, ao UM. É a fase inicial da iluminação espiritual (aprendizes), quando o Amor Incondicional começa a brotar, ou melhor, reflorescer dentro da alma humana, pois esse Amor é inato na centelha divina que nos anima (essência-alma), mas quase sempre é suplantado pelos egos. É o fim do sofrimento, porque há o entendimento dos mecanismos da vida, da morte e do aprendizado evolutivo. Tudo é encarado como experiência de vida, até mesmo as situações de dor. Esse é o Amor, essa é a Luz a que Michael se refere.  



A BATALHA DOS PIRILAMPOS


E a bruxa se trancou no seu castelo de ilusões. Meus ídolos morreram assassinados, de AIDS, ou envelheceram sem conseguir mudar o mundo. Escondi-me da vida, que não sabia viver, das pessoas que não conseguia entender, das coisas que me doíam nos olhos. Deixei que os dragões engolissem meus medos e meus desejos. Amarelei na janela a tarde que já ia morta e adormeci na incerteza do que fazer amanhã.

É difícil ter coragem de mudar, de ir contra tudo que regraram na sua cabeça. É difícil desfazer laços, conceitos, normas preconcebidas. E como dói virar uma página, começar de novo um outro caminho, do zero, do nada, armada única e simplesmente com a vontade e a garra da própria alma.
Eu tive medo, eu tenho medo. Um passo à frente significa sempre um risco mas, ao mesmo tempo, é inevitável e necessário. Eu tenho muito medo das passadas porque não enxergo no escuro. Só os que têm fé caminham no escuro. Mas meu medo não é do passo, é da chegada. A dor da frustração é insuportável e não sei lidar com ela. Sufocada de pavor, procuro sempre uma janela, um jeito de me expor sem apanhar. Às vezes, eu gostaria que o mundo parasse e que houvesse tempo para pensar, achar um jeito de evoluir sem dor. Inútil. O tic-tac redondo não pára, a vida também não, e eu sigo atropelando meus sonhos. Viajar para dentro passou a ser um recurso de autodefesa porque o que mais detesto na vida é conter meus impulsos para parecer uma pessoa normal e ser aceita pela Humanidade. Afinal, eu sou um ser movido a paixões. Paixões fortes e rápidas. Paixões que me estilhaçam e me deixam varada no meio do mundo.
Cansei de esconder-me atrás do que não sou e, na realidade, ser apenas nada. As paixões afloram e explodem, rompem a difusa cortina da razão e desnudam o cerne da sua essência. Eu nasci para as paixões, para as grandes paixões, para estourar o peito numa emoção, para sofrer e vibrar com a mesma intensidade. A emoção é uma coisa fantástica. A emoção me excita, me fascina. É uma sensação de viver nas nuvens, ao mesmo tempo que à beira do abismo. É uma sensação de felicidade que me assusta, que machuca, que me rasga por dentro.
É tão tênue o limite entre a loucura e a rebeldia que me confundo onde me encontro. Não encontro respostas no vento e tudo parece perdido, sem alcance, sem melhora; pior, sem retorno. O tempo que escapa apavora a alma e a busca se torna mais desesperada e sem alívio. Onde buscar a paciência dos sábios, quando o tempo parece líquido, esvaindo-se por entre os dedos? Qualquer sonho no futuro é água saindo pelo vão dos dedos. De repente, a gente descobre, a duros golpes, que o amanhã não existe, é pura especulação. A despeito disto, temos que seguir tentando acreditar em alguma coisa. Viajantes do nada.
A vida parece tão fácil para as pessoas ao meu redor, tão simples quanto dormir e acordar, sem sonhos. Por que eu tenho que sonhar? Para quê essa dor corroendo os nervos e as esperanças, essa impaciência descabida de ser feliz? O vento que açoita a janela não me traz qualquer resposta nem me alivia a ansiedade. Deixo escapar um suspiro que se perde no forro branco do quarto, sem eco e sem razão. Foi-se apenas.
Porém, um guerreiro nunca desiste, nunca se dobra. Às vezes, some do mundo para repensar os tropeços e juntar energias. Mas, um dia, ele volta. Ah, se volta! Volta mil vezes se assim for preciso. E volta com raiva, volta prá briga. Volta prá valer.
O sol quente daquela manhã de maio amarelou o quarto e levantei-me com a costumeira preguiça de encarar o mundo. Não sei se era preguiça. Talvez fosse medo. A teimosia do tempo em não me dar tempo para raciocinar irritava-me profundamente. Eu precisava meditar, arrumar as idéias na cabeça, fazer tudo de caso pensado, premeditadamente, mas a maldita pressa de viver atropela-me a mente. Eu sempre tive muita pressa, desde muito pequena, e a mania de encurtar caminhos rendeu-me chagas profundas e sem remédio. Nem o tempo, que se diz o remédio de todos os males, tem o menor poder de aliviar-me as dúvidas. Dúvidas de mim mesma, sonhos que não consigo realizar. Não sei até que ponto sou capaz de me superar, de ir adiante, me descobrir. Descobrir...! Qual será o meu limite? Acho que nunca vou saber. Talvez nenhum ser humano consiga conhecer-se, afinal, a vida é apenas uma sucessão de tropeços. A diferença é que, às vezes, caímos para frente; outras vezes, para trás. A única verdade é que caímos e, no chão, no fundo do poço, o que nos resta é o óbvio: levantar ou morrer. E morrer de olhos abertos é cruel, é indigno. Não sou um verme ou, pelo menos, não quero ser. Quem sabe não seja essa busca o meu caminho? O calvário que seja, mas um caminho, uma trilha cega a procura de um ópio que me aplaque a fúria do peito sonhador, desbravador, que assusta e enobrece, mas machuca como quê.
O canto de um pássaro insistente sacode-me a realidade diante dos olhos. Um cheiro de mato invade a janela com a mesma brutalidade com que cresce nas encostas dos morros; agreste, abrupto, rebelde. A maldita rebeldia que me arremessa o peito de encontro aos muros da minha estrada; essa estrada comprida demais. A claridade cansativa do dia é uma afronta às nuvens que se revolvem dentro de mim. É incrível como a natureza nos desafia e nos contesta a cada segundo; segundos que se vão e não voltam, como uma maldição sobre todas as cabeças. Segundos que nos envelhecem e nos criam rugas na alma. Tento espaventar do pensamento fantasmas que me afligem e me enfraquecem na hora de enfrentar o mundo. Mal presto atenção na roupa que pego no armário. Pouco importa o que o corpo veste quando a alma está nua e não se tem como cobri-la. Não posso simplesmente afogar os medos, pois seria uma solução fácil demais, uma mutilação inconseqüente e inútil demais. É preciso não ter medo da próxima curva, nem do que existe atrás do muro. É necessário ter a coragem de descobrir os encantos escondidos porque são os tesouros mais preciosos que se escondem por trás de armaduras de ferro. A coragem da ousadia é que determina o estigma do vencedor e estabelece a distância entre o medíocre e o genial. Só precisa de ídolos aquele que não tem brilho próprio. São as mil caras anônimas que aplaudem da arquibancada a imagem do auge que não foram capazes de atingir. Máscara de um palhaço de cara lavada que não tem porquê sorrir nem chorar. Porre da madrugada sem lua e sem estrelas, transgressão do óbvio e do esperado. A regra da lógica só é válida para os homens comuns. Aos gênios foi reservada a missão de driblar a realidade e fazer acontecer o impossível. É o eterno abismo entre um puro sangue e um pangaré. Um abismo que se alarga e se aprofunda à medida que se olha para frente e nada se vê, além de um buraco negro. E o caminhar fica cada vez mais difícil, porque é difícil evoluir, amadurecer. Já se disse um dia que “amadurecer é mudar de medos”. Envelhecemos quando os medos substituem os sonhos e os lamentos matam os devaneios. Por isso dói. De repente, a vida despe-se à sua frente, e nua ela não é tão bela. Os caminhos têm pedras, as trilhas são tortuosas e estreitas e o fim do caminho a vista não vê. Dói-se de medo e de esperança. Saber o que há por trás dos morros é nosso destino, nosso vício e nossa desgraça. Curiosos, vamos indo, caindo, subindo, sangrando e rindo nem se sabe de quê. Algozes de nós mesmos criamos nossas próprias feridas, nossos próprios fantasmas e carregamos com eles até o fim do caminho. Um caminho que não se vê o fim, se é que ele tem um fim. Só se sabe que não tem volta, nem remédio.
Volto à janela do mundo e vejo as pessoas caminhando trôpegas a procura de algo, um ponto de referência, um ponto de luz que as aproxime da opulência e da onipotência dos ídolos. Cegas, espelhando-se em ilusões, elas seguem, correndo atrás da fantasia dos deuses carnais e se atropelam, se esmagam e se acabam na poeira dos próprios pés, sem se darem conta de que o mundo vai ser sempre assim: um enorme abismo entre os seres. Uma Etiópia jamais será uma Suíça. Jamais se conseguirá aproximar os extremos e, talvez, a grande sabedoria é conseguir acostumar-se com o lado do abismo em que se está. Talvez seja a parte mais difícil do crescimento humano: trocar os sonhos pela realidade e conviver com ela a cada amanhecer, até que não amanheça mais.
Só a dimensão do sonho pode determinar o valor da vitória ou a dor da derrota, porque o sucesso escraviza, mas o fracasso anula. “Vencer é muito fácil. Preciso é me preparar para perder”, foram palavras de Ayrton Senna. Afinal, um mito é apenas um nome, uma imagem, a fantasia de um eu comum preso aos laços da idolatria e da superação. Superar limites é o único caminho para a perfeição e só os que se superam, se imortalizam. Os que se conformam, se pluralizam e acabam sendo apenas mais um em um monte de ninguéns. Mas, para que existam os máximos, são precisos os mínimos; pelo menos como objetos de comparação.
 É mais simples ser mais um, porém, é mais nobre escolher um dos lados do abismo ou se adaptar ao lado em que se está. Aprender a pisar o chão sem brilho é uma aventura e um mistério ao mesmo tempo. Ninguém garante de que lado está a felicidade, nem se ela existe de um lado ou de outro. É uma busca insana e sem rumo de todos nós, mitos ou mortais, porque nossos corpos apodrecem na mesma terra, mas nosso ser permanece ou fenece, de acordo com nosso caminho, nossa trilha cega em direção ao desconhecido.


ESTILHAÇOS DE CRISTAL

A fúria dos deuses abateu-se sobre mim. Foi como se o teto ruísse e tombasse por terra todos os meus castelos. Castelos de sonhos, sonhos de areia, areia movediça... tão somente areia. O sonho que tanto sonhei escapara-me por entre os dedos na reta final.
A dor que me corroía a alma era tamanha que se um abismo se abrisse entre mim e o chão, eu não o enxergaria. O fundo de tudo mostrava-se tão negro que perdi o caminho e sentei-me para chorar. Chorar por mim mesma, chorar a pena de tudo, chorar pela luta que não ganhei. A vida é que sempre ganha. A mão forte de quem tudo cria é que empunha a espada e a bandeira branca. O que nos compete é só escolher e abrir a janela.
Fui abrindo fresta por fresta, com medo que a claridade me cegasse os olhos. O sol foi entrando e aquecendo aos poucos meu corpo trêmulo e febril. Uma tela desenhou-se no horizonte e, como num filme, descobri o porquê de tudo. A mão que tudo governa puxava-me do abismo. Eu via escorrer de mim a soberba, o orgulho, toda sede de poder que se escondia por trás daquele sonho. Entendi porque todo o Universo conspirara contra a realização daquela fantasia desastrosa, danosa e perversa que, talvez, não tivesse um caminho de volta.
A revelação chocou-me, fez-me sentir um verme e, em lágrimas, agradecer por ter ganho a batalha que julgara perdida. Mais uma vez, a “bênção de Deus entrou estilhaçando-me todas as vidraças”, mas, no brilho dos cacos, vi pela primeira vez a sua face nítida e doce como a de um Pai, cujo conselho sábio fora entendido. Ajoelhei-me diante da vida e pedi perdão, e lavei a alma, e juntei os cacos e segui caminho. Coisas que reneguei agora me faziam falta e uma sensação de solidão se apossou de mim. Meu egoísmo fora tamanho que eu não tinha para onde voltar, ou para quem voltar. Nenhum lugar era meu lugar; eu havia perdido o mundo.
Talvez ainda houvesse tempo de rever páginas rasgadas, recordações envelhecidas pelos anos, nubladas sensações desgastadas. Mas onde buscar abrigo? Onde encontrar ajuda, onde o porquê de todas as coisas, de todos os seres, de todos os acontecimentos e de tudo que move o mundo?
Alguém me tomou das mãos e me fez caminhar até um castelo muito pobre, habitado por pessoas humildes que me receberam com um sorriso sincero.
– Venha – disse-me um deles – Seja bem-vinda!
Entrei e a paz que senti foi tamanha que me deixei chorar sem controle. Uma nuvem de fumaça descortinou-se à minha frente. Era seguir ou voltar. A duras penas segui trôpega e indecisa, mirando a luz que a cada passo tornava-se mais nítida e mais intensa. Havia no fundo uma escada, uma longa e estreita escada que se perdia na luz. Não havia ali, definidamente, um último degrau. A luz deixava ver com nitidez apenas os primeiros. Continuei caminhando e, quanto mais andava, notava que o caminho era muito longo. Senti medo, senti frio, tive dúvidas, mas, acima de tudo, queria chorar. Sentia no peito a certeza absoluta de que precisava chegar. Meu corpo suava e tremia quando me vi diante do primeiro degrau. As pernas pesavam tanto que me tornaram dificultoso e dolorido o primeiro passo. Uma voz no fundo da alma soou imperiosa e doce ao mesmo tempo: – Suba! – e eu subi, insegura e tonta, o primeiro degrau. A sensação de leveza e felicidade foi indescritível.




Foi-se a inspiração dos repolhos, emergindo a serenidade das borboletas. De repente, o mundo adquiriu todas as cores e a vida travestiu-se de todas as caras. Vozes desencontradas tornaram-se sensíveis canções. Donde a agonia das dúvidas e dos medos? Medos fantasiados de audácia e coragem? Germinou a força e a esperança, a certeza de que existem as chances, de que é possível emergir da lama.
Às vezes, “é impossível deter o rio da vida”. Grandes ondas nos arrastam para mundos desconhecidos, situações estranhas que nos assustam ou nos fascinam. Não é tão fácil lidar com o novo. Tantas vezes nos sufocamos com a própria incompetência diante das coisas! Mas a Sabedoria Suprema inventou as praias. Às vezes, chegamos nadando em cansadas braçadas; outras tantas, somos trazidos pela força das ondas, semi-afogados e quase inconscientes. Salvos das ondas, o brilho do sol pode nos inebriar ou nos cegar; vai depender da maneira como o encararmos. E assim é com todas as coisas. É preciso sabedoria para viver.
Na medida em que caminhava pelos degraus, o raio de luz parecia invadir-me o peito e viciar-me a alma. Eu queria mais e mais luz. Eu queria mais e mais paz. A sensação de leveza era tamanha que me sentia bêbada de amor, de vontade de servir. Eu precisava abraçar o mundo. Só que o mundo era grande demais e meus braços não o alcançavam. Frustração e angústia misturavam-se à euforia da minha grande descoberta, confundindo-me a lucidez de escolher o caminho. Era preciso recobrar o raciocínio, a serenidade e conjugá-los à força descomunal que descobria em mim. Então, parei. Sentei-me no degrau em que me encontrava de pé, respirei fundo e mirei as cores do céu. Estavam mais fortes. Até os passarinhos cantavam mais alto, disputando espaço nas árvores que resplandeciam mais verdes. Fiquei estagnada por muito tempo, observando as cores e os sons da vida, ouvindo a doce harmonia do silêncio. Nunca havia percebido antes tal coisa: o silêncio fala. Eu estava ouvindo o sussurro de Deus no meio do vento, varando-me o peito. Qual não foi meu espanto ao descobrir que a felicidade dói. Dói tanto ou até mais do que a tristeza, e também faz chorar. Eu precisava chorar porque meu coração estava repleto e poderia estourar.
A grande sabedoria do homem é saber ouvir a voz do silêncio. É quando o mundo se cala que se pode ouvir a alma. A nitidez da voz oculta se intensifica na medida em que nos tornamos capazes de fechar os lábios e os ouvidos e contemplar o Universo. A imensidão de um mundo sem fronteiras e sem limites é uma visão arrebatadora dos sentidos. O infinito baixa até nossa mesquinhez e nos alivia a ignorância. Torna-se, então, possível aprender mais com o silêncio do que com palestras catedráticas. Diante da alma do mundo, o sábio não é mais do que um grão de areia. A natureza é mais velha, portanto, mais sábia do que o homem.
Como num filme, vi-me em todos os momentos e em todos os lugares. Fiquei frente a frente com tudo que eu era, com todos os meus defeitos e algumas míseras qualidades. Minha imperfeição sem máscara prostrou-me porque deixou nua e clara a pequenez de meu ser. Dei de cara comigo sem me olhar no espelho. Deus! A gente é tanta coisa que não sabe que se assusta com a própria imagem, quando a máscara do cotidiano o vento leva. Abençoado vento que nos descobre para nós mesmos e nos verte sangue na alma. Crescer dói.
Só então tive consciência do tamanho da escada que se estendia à minha frente e da batalha a travar com meu próprio eu para escalar cada degrau. Não se esquive de encarar o inimigo – que na maioria das vezes somos nós mesmos – porque a força da alma está nos olhos, que são a expressão dos pensamentos e emoções. Jamais baixe a cabeça durante um combate; olhe a vida de frente. Enfrente as paixões inferiores com as armas do bom combate na firmeza dos pensamentos elevados.
Porém, para escalar o futuro é preciso deixar o passado na condição de experiência e construir um presente, pois aquele é conseqüência destes. Ir em busca do seu caminho – cada qual tem um caminho para o mesmo fim, como criaturas únicas que somos -, ir em busca do seu lugar espiritual, da sua família cósmica.
O meu lar é onde me sentir feliz e por quanto tempo me sentir feliz. Os bens materiais nos escravizam ao tempo e ao espaço e nos impedem de voar e aprender a busca de nossos tesouros, aqueles que nos fazem crescer a mente e o coração e não apenas os bolsos. Foi difícil e doído entender isso, aprender que é imprescindível reconhecer os sinais, aqueles pequenos detalhes que nos permitem dar passos enormes. Sinto-me feliz por ter optado por meus sonhos em detrimento de meus bens. Nunca juntei tesouros da terra. Das poucas vezes que o fiz, os perdi nas curvas da vida. Se lhes chorei a perda, logo esqueci. Quando partir, levarei o gosto da liberdade e o aprendizado das tentativas; o sabor das festas das vitórias e a ferida feia das derrotas; enfim, a consciência de que vivi o tempo que me foi dado.
Nas minhas andanças, mudanças, idas e voltas, o que possa parecer inconstância aos olhos obesos do mundo, foram apenas aventuras de quem tinha sede de aprender. E quando se quer muito, a própria vida nos empurra.



Hoje, cada ilusão que se vai é como se eu ficasse mais órfã, como se estivesse vivendo de teimosa num mundo que não é mais meu. Estou perdendo o chão e ganhando o infinito. As coisas do mundo vão ficando cada vez mais distantes e desinteressantes. Estou tomando consciência da efemeridade das coisas que ficam e começo a enxergar o mundo como um todo. Não sou mais “eu”... sou “um”. Sendo um, também sou parte do todo e sem o todo eu não existo. Esse estado de coisas facilita-me a compreensão do Deus, da unidade divina no Universo. Como parte dessa unidade, sou responsável por tudo que existe. A evolução do mundo também depende de mim e, se assim é, minha tarefa é ser sempre melhor hoje do que fui ontem. E assim, cada dia, dou o melhor de mim. Isso é crescer. Isso é construir. Isso é evoluir. Aos poucos, estou voltando para Casa.




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